terça-feira, 2 de julho de 2013

Defesa de prefeito fala pela primeira vez


No último dia 2 de março de 2013, um duplo homicídio ocorrido no interior do Estado chocou os paraenses. O madeireiro Luciano Capacio, 32, e o advogado Jorge Guilherme de Araújo Pimentel, 53, foram assassinados covardemente por tiros de pistola quando jantavam num restaurante no centro de Tomé-Açu, nordeste do Pará. O caso teve ampla repercussão local e nacional. De acordo com o inquérito policial, Carlos Vinícius de Melo Vieira, prefeito de Tomé-Açu, e seu pai, Carlos Antônio Vieira, seriam os supostos mandantes do assassinato. Os acusados tiveram decretada a prisão preventiva no dia 6 de abril, mas se encontram foragidos.
Pelo que foi apurado pela polícia, podem ser duas as motivações do crime: a primeira seria política, já que Capacio teria o firme propósito de se candidatar a prefeito de Tomé-Açu com apoio de Jorge Guilherme, que militava no PSDB. A outra motivação seria de ordem econômica: Luciano teria denunciado irregularidades ambientais cometidas pela empresa de construção de Carlos Vieira, gerando uma multa de R$ 23 mil.
A polícia prendeu três suspeitos de envolvimento no crime. Dois deles, de 27 e 37 anos, são apontados como os executores do crime. Segundo a polícia, o mais velho seria pistoleiro profissional suspeito de matar outras seis pessoas com atuação em Paragominas, sudeste paraense, onde possui mandado de prisão preventiva.
O mais novo é suspeito de outro homicídio em Tomé-Açu, crime ocorrido em 2008 durante uma briga de trânsito. Após seu carro colidir com outro veículo, o suspeito travou uma discussão com o outro condutor e atirou contra ele. Ele fugiu da cidade e teve mandado de prisão expedido pela Justiça. O terceiro preso foi apontado como o homem que deu apoio à fuga dos pistoleiros. Todos estão presos no PEM 3. Além do prefeito e de seu pai, ainda estão foragidos o intermediário do crime e um terceiro pistoleiro, segundo a polícia.
Pela primeira vez desde o ocorrido, a defesa do prefeito decidiu dar sua versão dos fatos e afirma que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) está na iminência de analisar o habeas corpus, que poderá revogar a ordem de prisão de Carlos Vinícius. A defesa do prefeito aponta ilegalidades na condução do processo, a começar pela investigação policial.
Na condição de prefeito, segundo a defesa, Carlos Vinícius não poderia ter sido investigado sem autorização da segunda instância do Tribunal de Justiça do Pará. “O prefeito tem direito a foro privilegiado e, ao não ter tal condição respeitada, tornam-se nulas todas as provas colhidas. A motivação do crime também é colocada em xeque por falta de provas reais”, disse ao DIÁRIO o criminalista Antônio Nabor Bulhões, que entrou com pedido de habeas corpus junto ao STJ. Ele diz que a investigação foi dirigida contra o prefeito e seu pai, “em ambiente claramente político”.
A ilegalidade na investigação, segundo ele, começa pela violação à Constituição. “Pai e filho são inocentes. Estou confiante na decisão do STJ. Não podem ser presos por um crime que não cometeram”. O inquérito da Polícia Civil aponta que o crime seria represália pelo rompimento político entre o prefeito e Luciano Capacio, uma vez que o empresário teria se aliado ao grupo político do ex-prefeito Francisco Eudes, sob a promessa de que seria o próximo candidato à prefeitura de Tomé-Açu.
“Carlos Vinícius não teria motivo para entrar em disputas políticas, considerando que foi reeleito com a maioria de votos. No ano passado, 61,96% dos eleitores o escolheram para comandar a cidade, em detrimento do candidato do PSDB. Vinícius tem sido apontado como liderança política emergente no Estado”, aponta Bulhões.
A OAB do Pará ingressou no processo exercendo papel acusatório, o que na avaliação da defesa do prefeito é inusitado e incompatível com a natureza de suas funções. “A missão da OAB é zelar pelo estado democrático de direito e pela defesa da Constituição. Essa atitude indica um nítido viés político permeando o caso”.
Defesa vê motivações políticas na investigação policial
A defesa do prefeito lembra que o empresário assassinado já foi apontado como mandante em pelo menos dois assassinatos, um deles ocorrido em 2012, por questões fundiárias. A vítima foi o ruralista Cesar Busnello. Para a defesa do prefeito, são fortes os sinais de injunções políticas sobre a conduta e as conclusões da Polícia Civil, “que não apurou essa situação e teria escolhido como testemunhas e informantes pessoas ligadas aos grupos rivais, derrotados nas eleições”.
Bulhões afirma que desde o início das investigações haviam fatos importantes que, se bem investigados, poderiam levar à elucidação do crime, sem que se pudesse cogitar de qualquer envolvimento do prefeito ou do seu pai com os eventos delituosos.
O advogado questiona o fato de as investigações terem sido conduzidas e concluídas sem que o prefeito e seu pai tenham sido intimados e convidados a prestar esclarecimentos, “mas sumariamente julgados e tratados pela Polícia Civil como únicos suspeitos no comando dos crimes”. Esse é o argumento que sustenta o pedido de habeas corpus, aspecto que, na opinião do advogado, “contamina e coloca em xeque todo o processo”.
A defesa aponta uma “sucessão de erros e distorções, que culminaram na manipulação do processo e o decorrente pedido de prisão preventiva”. Nabor contesta todos os procedimentos da polícia e sustenta que o caso foi conduzido ao arrepio da lei, colecionando irregularidades e ilegalidades. “Fiquei espantado com o que está acontecendo e trabalhamos para reverter os danos causados por todos esses erros”, afirma.
O advogado também destaca a fragilidade dos indícios apontados pela polícia, cujas provas não foram apresentadas, e denuncia o aproveitamento de documentos falsos nos autos do processo. “As investigações ignoraram a situação do empresário Luciano Capacio, que vinha sendo objeto de ameaças em decorrência de seus negócios”, garante o defensor do prefeito.Uma outra vertente vincula a outra vítima de homicídio, o advogado Jorge Pimentel, a uma profunda desavença com um dos acusados de autoria material do crime, que segundo uma testemunha, teria razões para eventualmente matar o advogado. “Essa vertente investigatória foi absolutamente ignorada. Estou citando uma entre várias vertentes importantes de investigação que foram ignoradas”.
Madeireiro lutava contra prefeito após ser multado
Entre os mitos fartamente divulgados como justificativa para o duplo homicídio estariam, segundo a defesa, o fato do empresário Luciano Capaccio e seu advogado Jorge Pimentel terem denunciado empreendimentos do pai do prefeito e essa denúncia originado uma multa de R$ 23 mil. “A polícia se baseia em arquivo digital sem assinatura e não protocolado nos órgãos competentes. A multa existiu, mas não para o pai do prefeito e sim para uma área de propriedade de Luciano, que teria feito um desmatamento ilegal. A área estaria em nome de um laranja”, diz Bulhões.
Ele diz ainda que a acusação aponta que, além de sofrer a fiscalização em suas terras, Capacio lutava contra a atual prefeito porque a Secretaria Municipal de Meio Ambiente de Tomé-Açu estaria cobrando uma suposta e descabida “taxa de controle ambiental” para liberação de alvarás. A documentação só seria liberada aos amigos do prefeito. “Nunca existiu qualquer denúncia feita pelas vítimas em relação à secretaria de Tomé -Açu. A polícia tirou conclusões à margem dos elementos de prova coligidos aos autos”, garante o advogado.
A defesa também contesta uma suposta “lista de execuções” com os nomes de oito pessoas supostamente marcadas para morrer, que teria sido extraída de CPU recolhida na casa do prefeito. “Essa lista não existe. Foi recolhida a CPU de captura de imagens do sistema de câmeras de vigilância residencial (CFTV) da casa do prefeito. A suposta prova não foi juntada nem ao inquérito policial, nem ao processo judicial criminal simplesmente em razão de não existir”, assegura.
Por fim, as investigações apontam que o prefeito teria uma relação amorosa com a esposa da vitima (Capacio). ”Essa é mais uma inverdade, já que nunca foi apresentado qualquer indicio que justificasse tal relacionamento”.Ouvido pelo DIÁRIO, o delegado Sílvio Maués, diretor de Polícia do Interior, não entrou no mérito das acusações da defesa do prefeito de Tomé-Açu no que se refere a ilegalidades na condução do processo. Ele confirmou que a polícia teve sim autorização do Tribunal de Justiça do Estado para investigar Carlos Vinicius Vieira. “Como fazer uma investigação dessa sem respaldo judicial?”, indaga.
Ele esclarece que a Polícia Civil do Pará não investiga grupos políticos e sim homicídios. Nesse caso um duplo homicídio. “A polícia instaurou o inquérito, investigou e identificou os mandantes, intermediários e executores. E como o prefeito poderia ser ouvido se está foragido desde o crime?”, indaga novamente.
Maués assegura que toda a investigação foi feita dentro da legalidade. “Prova disso é que o Ministério Público denunciou cada um dos envolvidos no crime, provando que a condução da investigação foi pautada na legalidade. Cada um fala o que quer e lógico que a defesa vai desacreditar nosso trabalho. Mas existe o fórum adequado para que todas essas colocações sejam feitas, que é o juízo”
 Diário do Pará

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